— Eu jamais fui infiel a minha mulher, doutor.
— Sim.
— Aliás, nunca tive outra mulher. Casei virgem.
— Certo.
— Mas, desde o começo, sempre que estava com ela, pensava em outra. Era a única maneira que conseguia, entende? Funcionar.
— Funcionar?
— Fazer amor. Sexo. O senhor sabe.
— Sei.
— No princípio, pensava na Gina Lollobrigida. O senhor se lembra da Gina Lollobrigida? Por um período, pensei na Sofia Loren. Fechava os olhos e imaginava aqueles seios. Aquela boca. E a Silvana Mangano. Também tive a minha fase de Silvana Mangano. Grandes coxas.
— Grandes.
— Às vezes, para variar, pensava na Brigitte Bardot. Aos sábados, por exemplo. Mas para o dia-a-dia, ou noite-a-noite, preferia as italianas.
— Não há nada de anormal nisso. Muitos homens...
— Claro, doutor. E mulheres também. Como é que eu sei que ela não estava pensando no Raf Valone o tempo todo? Pelo menos eram da mesma raça.
— Continue.
— Tive a minha fase americana. A Mitzi Gaynor.
— Mitzi Gaynor?!
— Para o senhor ver. A Jane Fonda, quando era mais moça. Algumas coelhinhas da Playboy. E tive a minha fase nacionalista. Sônia Braga. Vera Fischer. E então começou.
— O quê?
— Nada mais adiantava. Eu começava a pensar em todas as mulheres possíveis. Fechava os olhos e me concentrava. Nada. Eu não conseguia, não conseguia...
— Funcionar.
— Funcionar. Isso que nós já estávamos na fase da Upseola.
— Upseola?
— Uma por semana e olhe lá. Mas nada adiantava. Até que um dia pensei num aspirador de pó. E fiquei excitado. Por alguma razão, aquela imagem me excitava. Outro dia pensei num Studebaker 48. Deu resultado. Tive então a minha fase de objetos. Tentava pensar nas coisas mais estranhas.
Um daqueles ovos de madeira, para cerzir meia. Me serviu duas vezes seguidas. Pincel atômico roxo. A estátua da Liberdade. A ponte Rio-Niterói. Tudo isto funcionou. Quando a minha mulher se aproximava de mim na cama eu começava, desesperadamente, a folhear um catálogo imaginário de coisas para pensar. O capacete do kaiser? Não. Uma Singer semi-automática? Também não. Um acordeom, quente, resfolegante... Mas, depois de um certo tempo, passou a fase das coisas. Tentei pensar em animais. Figuras históricas. Nada adiantava. E então, de repente, surgiu uma figura na minha imaginação. Uma mulher madura. O cabelo começando a ficar grisalho. Olhos castanhos... Era eu pensar nessa mulher e me excitava. Até mais de uma vez por semana. Até as segundas-feiras, doutor!
— E essa fase também passou?
— Não. Essa fase continua.
— Então, qual é o problema?
— O senhor não vê, doutor? Essa mulher que eu descrevi. É ela.
— Quem?
— A minha mulher. A minha própria mulher. Me ajude, doutor!
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