Filho de Érico Veríssimo, um dos maiores nomes da literatura nacional, Luis Fernando Verissimo nasceu em Porto Alegre, em 26 de setembro de 1936. Aos 16 anos, foi morar nos EUA, onde aprendeu a tocar saxofone, hábito que cultiva até hoje – tem um grupo, o Jazz 6. É jornalista, mas “do tempo em que não precisava de diploma para exercer a profissão”. Antes de se dedicar exclusivamente à literatura, trabalhou como revisor no jornal gaúcho Zero Hora, em fins de 1966, e atuou como tradutor, no Rio de Janeiro. Casado há mais de 30 anos com Lúcia Verissimo (“não é a atriz, não é a atriz!”), sua primeira “namorada séria”, tem três filhos: Fernanda, Mariana e Pedro.

quarta-feira, 4 de maio de 2011

O poeta


   Disse o homem:

   — Teus cabelos são como trigais ao vento, tanta beleza eu não aguento.

   A mulher sorriu. Era a primeira vez que iam para a cama. Ela não sabia

que ele fazia versos. Ainda mais numa situação daquelas. Ele continuou:

   — Tua fronte, amada, tem o frescor da madrugada. Teus olhos límpidos e sensuais são como tépidos mananciais. Esses lábios lindos de que és dona, como pétalas de anemona...

   Ela hesitou, depois disse:

   — Acho que é anêmona.

   — Como é?

   — Não é anemona, é anêmona.

   — Tem certeza?

   — Não tem importância. Continua.

   — Espera. O que é que rima com anêmona?

   — Deixa pra lá.

   Mas ele tinha sentado na cama e agora, em vez de acariciá-la, espremia a própria cabeça.

   — Anêmona, anêmona...

   — Sêmola.

   — Hein?

   — Sêmola rima com anêmona.

   — Pois é... — hesitou ele.

   Era um desafio. Ele levantou-se da cama e deu algumas voltas, nu, pelo quarto.

   — Sêmola, sêmola...

   De repente estalou os dedos. Tinha encontrado. Voltou rapidamente para a cama e retomou a mulher nos braços.

   — Onde nós estávamos?

   — Na boca.

   — Tua boca tem gosto de sêmola, teus lábios são pétalas de anêmona.

   — Você é um poeta mesmo.

   — Todo o teu rosto tão raro do nosso amor é o labaro.

   — Não é...

   Ele parou e afastou-se.

   — Não é o quê?

   — Nada, não. Continua, continua — disse ela, puxando-o de volta.


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